segunda-feira, 23 de maio de 2011

Mortos

16/04/2011

Um dia normal… Um dia que parecia normal.
- Amor… – Começou ela.
- Diga… – Respondi. Estávamos deitados lado a lado em sua casa, no sofá.
- Que horas você tem que ir? – Perguntou ela pensativa.
- Umas cinco, mais ou menos.
- Só vai ficar até as cinco?
- Uhum, tenho que chegar mais cedo em casa hoje.

- Poxa.
- Que horas são?
- Já são dez pras cinco – Respondeu olhando no relógio de ponteiro, que permanecia quietamente pendurado na parede, logo acima do sofá.
- Sério?? - Apertei forte a minha mão contra a dela – Nem vi o tempo passar.
- Nem eu.
Vinte minutos depois ainda estávamos lá, mãos entrelaçadas e uma conversa se desenrolando anonimamente.
Cinco minutos e quarenta e seis segundos depois já estávamos na portaria do condomínio, ela estava fechando o portão, e eu permanecia do outro lado, olhando-a como se fosse a ultima vez que a visse.
Sete minutos mais tarde ela havia se jogado no sofá, porém dessa vez estava sozinha, e eu, permanecia sentado em uns bancos de madeira.
estava no ponto de ônibus, com a intenção de voltar pra casa.
Mais cinco minutos se passaram e eu tinha acabado de entrar naquele automóvel, entregado o dinheiro ao cobrador, recebido o troco e me sentado em um daqueles bancos de plástico, infortunadamente ao lado de um senhor de idade.
Aquele banco era o único que estava vazio.
Puxei o meu fone da mochila liguei-os ao celular e comecei a escutar musica, um rock primeiramente agitado e barulhento, continuei o percurso quase todo viajando nas musicas e perdido em lembranças passadas. Olhei por fora da janela, e lá estava o ponto que deveria descer, pra por fim pegar outro ônibus que me levaria diretamente pra casa, me levantei e dei sinal pro motorista parar.
O Senhor ao meu lado fez exatamente o mesmo.
Antes de descer as escadas daquela caixa de metal olhei discretamente pra trás, e juro que reparei aquele mesmo senhor fazendo um gesto do catolicismo, e murmurando “do pai, do filho e do espirito santo”.
Estremeci.
Sem muita atenção eu continuei caminhando, em direção ao próximo ponto de ônibus, que foi a pior viagem da minha vida, a noite reinava, e a Lua coberta por singelas nuvens planeava na escuridão atormentando a todos que a vissem, minúsculas gotas de chuva despejavam sobre nossas cabeças, incomodando-nos. Observava toda essa paisagem somente com uma virada, e não deixava de mover minhas pernas simultaneamente.
Até porque, o que mais poderia acontecer?
Pois é… eu estava errado.
“Praça da sé” li escrito logo à frente de um ônibus, dei sinal pra ele parar, subi nele e dentre todas aquelas pessoas que permaneciam ali, cada uma indo pro seu lugar, para suas casas, para os seus destinos, incomodamente me esquivei de todas elas e me posicionei em um lugar menos desconfortável.
Olhei para uma mulher, já adulta sentada em um dos bancos em minha frente, e por incrível que pareça ela estava dormindo, olhos fechados e o corpo totalmente relaxado, deixando-se levar pelo balanço irresistível do automóvel.
Cerca de 20 minutos depois faltavam dois pontos para chegar o meu, já estava encarando o motorista lá na frente para que chegasse logo, não sei porque, mas eu queria desesperadamente chegar logo em casa, era como se algo me impulsionasse. Pedi pro motorista parar no próximo ponto, e quando estava já descendo infortunadamente me virei, e vi algo que eu não queria ver… A mulher, ainda dormindo fazendo o mesmo gesto daquele senhor de idade, e murmurando inconscientemente as mesmas palavras, é eu realmente não queria ter visto.
Me assustei.
Ignorando a pura coincidência que tinha ocorrido me dirigi à casa, um passo de cada vez. Cheguei lá, tomei um banho e fui jogar Nintendo, um jogo de terror com Lucas, meu amigo, meu pai e meu irmão, sim… eu gritei muito, foi muito engraçado ver as caras que fazíamos quando nos assustávamos.
Eu parecia feliz.
Infelizmente umas 2 horas da manha meu pai pediu pra irmos dormir, pois já estava muito tarde, e foi isso que fizemos, sem discutir, Lucas dormiu no sofá, na sala, eu e meu irmão em nossas camas, no quarto, e meu pai, claro, em seu quarto em sua cama.
Realmente me arrependi de enquanto caminhava para o meu quarto não ter virado para trás, porque se o tivesse feito teria visto o corpo já imóvel pelo cansaço e o maldito sono ter se movimentado sonambularmente e feito um gesto já conhecido enquanto murmurava palavras inconscientemente.
Me deitei em minha cama e dormi imediatamente.
1 hora e 47 minutos depois meus olhos se abriram. Algo estava fora de lugar, A escuridão da noite ainda permanecia em todo o ambiente, e o medo se apoderava de mim como um predador se apodera de sua presa, me levantei vagarosamente, e então vi a morte.
Um ser com olhos brancos e cintilantes coberto pelas sombras lançou sua mão contra o meu tornozelo apertando-o com uma força absurda. GRITEI inutilmente.
Tentei me libertar porém eu não era poderoso o suficiente, puxei o abajur ao meu lado, e comecei a lança-lo contra a cabeça da criatura, com o ultimo e certeiro golpe ele me largou um único instante,  o instante necessário para que eu me levantasse e fosse me direção da sala.
Passei o olho pelo sofá, e o mais incrível… Lucas não estava lá.
Me esbarrei contra o Nintendo derrubando-o com uma força insana, me dirigi até a cozinha e permaneci lá, junto ao silencio e junto à escuridão noturna.
Estava com medo.
Entrando pela porta em vez de ver um par de olhos cintilantes eu vi três pares! As três malditas criaturas se lançaram contra mim, arrancando-me a pele, arrebentando com minhas forças, e enfim sugando a minha alma.
Tentei me libertar inutilmente dentre as três garras, desferi um chute no do meio, e com um esforço sobre-humano consegui me libertar e corri até a varanda, onde a luz escura da lua entrava em fachos pelas janelas de vidro.
Os três vultos negros foram caminhando lentamente para cima de mim, estremeci, não fazia a mínima ideia do que estava acontecendo. Tudo isso parecia um terrível e imenso pesadelo.
Os fachos de luz iluminaram cada um dos três rostos, e lá eu vi, o senhor de idade que sentou ao meu lado no ônibus, A mulher que estava dormindo no outro ônibus e um rosto que eu conhecia já faz anos, Lucas, aqueles rostos pálidos demonstravam fraqueza e terror ao mesmo tempo.
Percebi uma sombra humana transparecendo nos fachos de luz, me virei e vi o horror.
Milhares de Criaturas não humanas subiam e invadiam a varanda violentamente, olhei ao meu redor e dentre a luz e escuridão me senti totalmente morto.
As criaturas se lançaram em cima de mim, e a minha alma foi destronada.
De longe as pessoas que viram poderiam jurar que eu estava fazendo um gesto já conhecido por todos nós, e murmurando palavras também conhecidas.
Abri os olhos , sim fora somente um pesadelo. Suspirei agradecendo à Deus, olhei para o teto percebendo vários fachas de luz do sol que entravam pela janela entreaberta, cocei os olhos me levantando, e meio cambaleante fui andando para o banheiro, me olhei no espelho e o horror tomou conta de todo o meu corpo, no lugar dos meus dois olhos verdes, repousava solenemente dois olhos totalmente brancos e brilhantes.
E enquanto isso na sala o Nintendo permanecia arregaçado no chão.

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